Arte: Prefeitura Municipal de Simão Dias
No mundo
existem aproximadamente 17 milhões de pessoas com paralisia cerebral e 350
milhões estão ligadas a uma criança ou um adulto com PC
A pandemia
do coronavírus roubou completamente a atenção da população mundial, fazendo com
que outras doenças ou condições sejam deixadas para o segundo plano. Nos
últimos anos, dezembro ganhou a cor verde (Dezembro Verde) para
conscientizar a sociedade sobre a importância de entender e aceitar as pessoas
com paralisia cerebral. Em 2020, apesar das adversidades, essa missão tão
importante deve ter continuidade.
A paralisia cerebral (PC) é, por definição, uma
lesão no cérebro em desenvolvimento que pode ter acontecido ainda no ventre
materno, no nascimento ou após, até os dois anos de vida. Essa condição pode
levar a alterações do movimento, da postura, do equilíbrio, da coordenação e do
tônus muscular. As desordens motoras são geralmente acompanhadas por alterações
na cognição, comunicação, comportamento, epilepsia e problemas musculares e
ósseos.
Segundo o médico ortopedista pediátrico David
Nordon, o acompanhamento de uma equipe multidisciplinar com neurologista,
pediatra, oftalmologista, fonoaudiólogo, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional,
psicólogo, educador físico, nutricionista, além do ortopedista são essenciais
para a melhor qualidade de vida da criança com paralisia cerebral.
“A medicina avança e com ela os tratamentos que possibilitam mais
bem-estar e qualidade de vida. Hoje temos terapias alternativas para o
tratamento da espasticidade - aumento involuntário da contração
muscular -, que compromete o movimento ao enrijecer qualquer músculo do corpo
humano. Uma delas é a infiltração com a toxina botulínica, indicada
para crianças pequenas ou casos mais leves de rigidez. O procedimento também
permite perceber quais serão os efeitos da cirurgia, caso seja necessária. A
toxina desativa a musculatura temporariamente. É como se tivéssemos feito a
cirurgia sem fazer. No entanto, com a pandemia, muitos pacientes foram privados
dos seus tratamentos, apresentando regressões. As cirurgias e aplicações de
toxina botulínica também foram postergadas”, lamenta Nordon.
“Há diversas técnicas complementares que ainda
não têm comprovação de eficácia, como acupuntura ou vestimentas
terapêuticas. Porém, a regra é: se não faz mal para a criança nem para o cuidador,
pode tentar”, afirma. Um exemplo, segundo o médico, é a equoterapia (terapia
com cavalos), que auxilia, mas não pode ser feita por quem tem os quadris fora
do lugar, pois causa dor.
As cirurgias ortopédicas também contribuem positivamente, principalmente
quando realizadas para a melhora da contratura dos membros inferiores. O
procedimento tem por finalidade promover benefícios funcionais e será
colaborativo no sentido de diminuir os comprometimentos da espasticidade.
“Intervenções cirúrgicas devem ser realizadas quando se esgotam as
possibilidades de um tratamento menos invasivo aos pacientes. Na paralisia
cerebral, nosso objetivo é melhorar a capacidade de a criança deambular (modo
de caminhar) ou trazer mais conforto, tanto para a criança quanto para o
cuidador”, afirma Nordon.
O médico também alerta para a luxação do quadril em
pacientes com PC, que acontece devido à contratura muscular dos quadris.
“Crianças tetraplégicas espásticas (com musculatura rígida, sem movimento) são
as que apresentam maior risco de luxação. A dor no quadril ocorre
principalmente nos momentos de movimentação. A luxação na paralisia cerebral é
um fator de grande preocupação, que merece atenção precoce e contínua”, afirma
Nordon.
No mundo existem aproximadamente 17 milhões de
pessoas com paralisia cerebral e 350 milhões estão intimamente ligadas a uma
criança ou um adulto com PC, os dados são do movimento internacional World
Cerebral Palsy Day. No entanto, no Brasil, não há pesquisa recente sobre o
cenário. A doença apresenta-se em distintas variações e está diretamente
relacionada à extensão do dano neurológico: lesões mais extensas do cérebro
tendem a causar quadros mais graves. Os diferentes graus de comprometimento
motor e cognitivo podem levar a um leve acometimento com pequenos déficits
neurológicos até a casos graves, com grandes restrições à mobilização e
dificuldade de posicionamento em cadeira de rodas ou cama e comprometimento
cognitivo associado.
“Olhar com reverência e entender a condição dessas pessoas é o primeiro passo para uma sociedade mais inclusiva e respeitosa. Não podemos nos esquecer de que a criança com paralisia também compreende o mundo e tem sentimentos. Por esse motivo, movimentos como o Dezembro Verde são bem-vindos e extremamente necessários. A pessoa com paralisia cerebral precisa de acompanhamento profissional e deve ser colocada em reabilitação o mais breve possível. A medicina faz a sua parte em pesquisas, estudos e desenvolvimento de novas terapias. Os pais, a sociedade e as autoridades governamentais devem também cumprir a sua parte”, diz Nordon. Segundo ele, recentemente, na Holanda, teve início o desenvolvimento de um útero artificial para bebês que nascem muito prematuros, de 24 semanas. “Nos últimos anos, vimos uma mudança de padrão: as crianças têm paralisia cerebral porque conseguimos salvar as que nascem cedo demais, e a prematuridade tem seus custos. O útero artificial pode mudar isto”, finaliza, de forma otimista, o ortopedista pediátrico.