Foto: Arquivo Pessoal
Às vezes nos encontramos diante de
questionamentos que não sabemos responder, e, como homem e, pior, de
ascendência italiana, carrego na fúria repentina também um descontrole,
confesso. Conquanto, o que diferencia um ser furioso e agressivo dos outros? Qual
a razão para que algumas pessoas, especialmente figuras públicas homens, sejam
mais agressivas e destrutivas? Creio que as pessoas que tendem a responder
furiosamente a situações não possuem lucidez e se descontrolam facilmente,
sempre de forma agressiva e ameaçadora.
Nesses tempos em que grande parte da população se junta a uma liderança política descontrolada e sem lucidez compartilham a mesma vertente furiosa, a neuropatia é tão contagiosa que, sem motivo ou análise científica, criticam, gritam, ofendem e atacam a obrigatoriedade das vacinas que buscam preservar a humanidade, ou em outras situações desencadeantes, que, observadas de fora, parecem quase um pretexto para descarregar uma raiva interior que não pode ser aplacada de outra forma.
A ira (raiva) é uma destas quatro emoções básicas de comando no comportamento humano. Segundo especialista vem modulada pela testosterona, razão pela qual tende a ser mais percebida nos homens.
A ofensa, busca de inimigos, xingamento e outras atitudes de prejudicar outrem constituem uma emoção primitiva derivada das primeiras espécies humanas, gênero australopithecus e também o gênero humano. Dentre os australopithecus, encontra-se o australopithecus animensis, que teria vivido entre 4,2 a 3,9 milhões de anos atrás, e o australopithecus afarensis, que possivelmente habitava a Terra há 3,9 a 3 milhões de anos. Os dois possivelmente caminhavam sobre dois pés e o gênero homo, o primeiro hominídeo, seria o homo habilis e homo erectus.
A raiva, como a emoção apetitiva, que medeia todas as forças que nos movem a fazer, conquistar, saborear, regozijar; como o medo, que na medida certa é aliado da prudência e da autoproteção; e pânico de ansiedade de separação, que sentimos agudamente quando tememos o distanciamento das pessoas que amamos e/ou que nos ajudam a viver (sobreviver), física e/ou emocionalmente. No ser humano evoluído, que dispersou (livrou-se) de todos os traços humanoides, o núcleo “raiva” sobrevive de forma útil e saudável, que é ativado pela percepção de uma injustiça ou mal sofrido contra si ou contra outrem.
Desde a infância, sentimos raiva, se um amigo do jardim de infância pega a bola, se a prima rica não deixa você brincar com as bonecas dela, se nos aparenta que mamãe dedica maior atenção a um irmão ou irmã ou que papai nos repreende desnecessariamente, só porque está nervoso. A raiva situacional como uma emoção em resposta a uma injustiça percebida ou sofrida é um sentimento universal. É fisiológica quando é limitada em expressão, proporcional ao evento desencadeante e de duração limitada no tempo.
A raiva não pode conviver com os homens, isso foge da própria natureza animal e se desencadeia na intercorrência de doenças psíquicas. A ira, ou raiva, é antes um traço característico da personalidade (traço neuropático), isso quando tende a ser uma expressão dominante no comportamento devido à frequência, intensidade e duração com que uma pessoa a sente crescendo dentro de si, sem controle. O traço de raiva é um antecedente da raiva de estado, que é agudamente ativado e aumenta de forma reativa a situações externas: na família ou na sociedade.
Devemos nos policiar em razão das nossas iras-raivas, fato ser a personalidade colérica, em média, um estado elevado e um nível muito mais alto de irritabilidade interna e agressividade, que pode se transformar em transtornos com cometimentos de crimes, como de ameaças com arma de fogo contra vizinhos, espancamento de idosos, xingamentos de pessoas que já lhes foram amigas por décadas etc. Logo, como as regras sociais não comportam ações desse nível, fica claro o raciocínio de que a herança primitiva dos humanoides predomina naquela personalidade. Essa conduta (emoções) é negativa, aumenta rápida e explosivamente em resposta a situações de gatilho percebidas, denominado de descontrole emocional e que, não tratado, tende a agravar-se com o tempo. Aqui é que visualizamos o ponto crítico.
Pessoas zangadas/furiosas tendem a oferecer riscos às pessoas que convivem a sua volta, é uma questão de tempo para que o gatilho se movimente em uma circunstância importuna, com causas e efeitos irreversíveis.
Normalmente o controle destes neuropatas costuma interagir com quem eles sentem que podem interagir racionalmente, analisando-os, sem serem dominados por contrariedades. Precisamente por ser subtendida por circuitos neuronais primitivos condicionados pela predisposição genética, e reforçada pela tendência de usá-la como resposta reativa automática a todas as situações irritantes, a pessoa que convive com a ira (raiva) tende a se mover ao longo dos anos com automatismos cada vez mais rígidos, como se estivesse seguindo em frente os trilhos de um trem. Nesse caso, são os circuitos neuronais de baixa resistência que formam a base biológica dos hábitos e das respostas automáticas.
Curiosamente, o ser colérico é muito atraído por situações perigosas, com alta carga agressiva, que se aguçam quando encontram respaldo em outros com a mesma patologia. As pessoas mais controladas tendem a evitar o relacionamento ou, o que é mais frequente, limitar sua amizade apenas às necessidades de momento. Policiar e controlar a ira (raiva), para não ser dominado por elas, requer consciência, uma forte motivação para mudar e o aprendizado de estratégias emocionais e cognitivas mais racionais para expressar o dissenso ou reagir construtivamente a um sentimento de injustiça. Lembrando sempre que a justiça está inserida em um campo de avaliação coletiva, nunca pessoal e inquestionável.
Temos de estabelecer como premissa a educação no autocontrole, para pensar melhor o que se torna essencial para viver melhor. Ao mesmo tempo, aprendendo a respeitar as regras e a governar os sentimentos de injustiça de forma mais racional, procurar resolver suas questões, com diálogo, e não ataques, colocar-se no local que você sempre esteve e para onde voltará.
“A Síndrome do pequeno poder, segundo a psicologia, é uma atitude de autoritarismo por parte de um indivíduo que, ao receber um poder, usa-o de forma absoluta e imperativa, sem se preocupar com as consequências e problemas periféricos que possa vir a ocasionar. Trata-se de um problema social, e não individual, característico da nossa sociedade. Surge quando a pessoa não se contenta com sua pequena parcela de poder e se assume como superior ou detentora de responsabilidade sobre a liberdade de outrem, exorbitando sua autoridade”.
A “síndrome do pequeno poder” é muito comum em pessoas que assumem determinadas atividades estatais e se sentem superiores por essa razão, está diretamente ligada à raiva. Portanto, se não conseguirmos controlar quando adultos, o traço raivoso/furioso que se tornou dominante torna-se um fator de perigo para si e para os outros.
Artigo assinado por Osmir Bertazzoni, jornalista e advogado.