Foto: Divulgação/ Lollapalooza
Especialistas dizem que casos
citados na decisão de ministro do TSE não se enquadram como propaganda
eleitoral antecipada.
Uma decisão do Supremo
Tribunal Federal de 2021 diz de maneira explícita que “não se extrai
impedimento para que um artista manifeste seu posicionamento político em seu
shows ou em suas apresentações”.
Esse entendimento do STF
diverge de despacho do ministro do Tribunal Superior Eleitoral Raul Araújo, que
vetou a manifestação de apoio a pré-candidatos no Lollapalooza por achar que seria
configurar propaganda eleitoral antecipada.
Advogados e especialistas
ouvidos pelo Poder360 corroboraram a tese a partir da ADI (Ação direta de
inconstitucionalidade) 5.970, publicada em outubro de 2021 pelo STF (Supremo
Tribunal Federal). O item 3 do acórdão diz respeito à proibição de showmícios,
mas esclarece que artistas podem realizar eventos para angariar fundos para
campanhas.
O trecho citado por
especialistas afirma que “é também assegurado a todo cidadão manifestar seu
apreço ou sua antipatia por qualquer candidato, garantia que, por óbvio,
contempla os artistas que escolherem expressar, por meio de seu trabalho, um
posicionamento político antes, durante ou depois do período eleitoral”. Segundo
o advogado William Gabriel Waclawovsky, especialista em direito eleitoral, a
decisão do ministro do TSE esbarra no acórdão do STF e “destoa da
jurisprudência firmada tanto pelo STJ como pelo STF acerca da liberdade de
expressão. A expectativa que temos é que a decisão seja reformada nas próximas
horas, reafirmando o entendimento predominante dos Tribunais Superiores quanto
à liberdade de expressão”. Cristiano Zanin, advogado que atua na defesa do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tem o mesmo entendimento. Também cita
a ADI de outubro de 2021 e reafirma o direito da liberdade de expressão.
“A garantia constitucional da
liberdade de expressão não pode ser colocada em risco e tampouco pode ser
confundida com propaganda eleitoral antecipada, especialmente neste caso
concreto, em que houve manifestação espontânea de artistas e do público. Esse
entendimento, aliás, já foi reafirmado pelo STF no ano passado, no julgamento
da ADI 5.970”, afirmou o advogado.
Os casos citados no despacho
dizem respeito às manifestações das cantoras Pabllo Vittar e da britânica
Marina. A artista brasileira gritou “Fora, Bolsonaro” e depois pegou uma
bandeira do ex-presidente Lula com slogan utilizado na campanha ao Planalto em
2018. Já Marina xingou o atual presidente Jair Bolsonaro.
Em ambos os casos,
o Poder360 apurou que não houve violação da lei eleitoral, já que as
situações estão previstas na ação direta de inconstitucionalidade do Supremo.
Como uma ADI, o texto tem efeito vinculante, ou seja, deve ser utilizado como
base para decisões futuras de quaisquer tribunais. Neste caso, o acórdão não
teria seguido o entendimento do STF.
Segundo o artigo 36-A da Lei
nº 9.504, de 1997, a menção à candidatura e o elogio a qualidades do candidato
só configuram-se propaganda eleitoral caso haja o pedido explícito de voto. Eis
o trecho: Art. 36-A. Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que
não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a
exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e os seguintes atos, que
poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet:
(Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015.
Segundo explica a advogada
Vera Chemim, o uso da bandeira por si não ultrapassa o artigo. Ela lembra que o
TSE autoriza a utilização e demonstração de bandeiras, adesivos e afins de
candidatos. Já em relação à manifestação da artista britânica, Chemim disse:
“Se a Marina expressou antipatia com o Bolsonaro, ela faz parte do direito
individual, fundamental de liberdade de expressão”.
ENTENDA O CASO
No seu pedido contra
manifestações no Lollapalooza, o PL (partido de Jair Bolsonaro)
citou “propaganda eleitoral irregular” do ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva (PT). De acordo com o PL, os atos se enquadram como
propaganda eleitoral porque levam a “conhecimento geral” a possível
candidatura do ex-presidente Lula, devido ao tamanho e cobertura do evento. O
documento destaca ainda o “caráter propagandístico” dos atos, citando
a bandeira de Lula exibida pela cantora Pabllo Vittar, o que o PL disse ser
um “verdadeiro showmício”.
Na sua decisão, o ministro
Raul Araújo determinou a “proibição legal, vedando a realização ou manifestação
de propaganda eleitoral ostensiva e extemporânea em favor de qualquer candidato
ou partido político por parte dos músicos e grupos musicas que se apresentem no
festival, sob pena de multa de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) por ato de
descumprimento.
No entendimento de 3 ministros do Supremo Tribunal Federal consultados pelo Poder360, e que falaram em reserva (na condição de seus nomes não serem revelados), disseram que o TSE poderia ser mais explícito. Afinal, se for proibido criticar um político, nenhum artista poderá em seu show falar negativamente sobre, digamos, a política do governo Bolsonaro sobre o meio ambiente nem muito menos gritar para a plateia “fora, Bolsonaro”. Há também dúvidas sobre se é constitucional e em acordância com a Lei Eleitoral vetar manifestações de pessoas alheias à campanha política deste ano. A lei fala que é proibido alguém pedir votos, mas não está claro se isso refere a alguém que não tem filiação partidária e se posiciona a favor, digamos, de Lula, Ciro Gomes (PDT) ou Bolsonaro.
*Publicado por Danilo Telles, Jornalista da Rádio Metropolitana de Piracicaba