Foto: Arquivo Pessoal

Muito tem sido noticiado sobre o rol da ANS (Agência Nacional de Saúde) ser exemplificativo ou taxativo. É importante esclarecer o que isso significa e de que importa para a sociedade, quais os benefícios e perdas para ambos os lados.

De maneira simples e objetiva, se o rol da ANS for taxativo, a operadora de saúde é obrigada a cobrir apenas os gastos que constarem em sua lista de serviços. Tudo o que estiver fora da tabela deixa de ser obrigação da operadora. Já no caso do rol exemplificativo, a operadora pode ser obrigada a pagar pelo procedimento mediante interpelação administrativa ou mesmo judicial.

É necessário, antes, entender como funcionam os planos administrados pelas operadoras de saúde, seja Unimed, Amil, Geap ou outras. Elas têm como produtos diferentes tipos de planos. De forma geral, são separados para pessoa física ou jurídica e preveem coberturas variadas, com limitações, algumas inclusive com planos odontológicos.

O conceito básico desses planos é que determinados procedimentos são muito caros para se arcar sozinho. Então, juntam-se várias pessoas para dividir o valor e, caso alguma delas precise, será possível arcar com as despesas do procedimento. Outra estratégia é em relação à faixa etária. Considera-se que um paciente jovem use menos o plano de saúde que um idoso. Assim, o jovem paga uma parte pelo idoso, que dificilmente conseguiria arcar com um plano de saúde sem essa "ajuda". É como um fundo mutuário.

Pensando por ambos os lados - planos de saúde e usuários -, temos:

Se você é gestor da operadora de saúde, precisa calcular quanto deve cobrar de cada cliente para que os demais possam ser atendidos nas doenças que podem ocorrer (análise de risco). Para esse cálculo, podemos pensar que uma porcentagem da população atendida tem tantos por cento de chances de ter tal doença e isso tem um custo. Com base no rol de procedimentos da ANS, se chega a um determinado valor por paciente, possibilitando conseguir administrar o fundo e comprar os procedimentos daqueles que ficarão doentes. Hoje, as operadoras de saúde têm como meta uma sinistralidade (a relação do quanto se arrecada e do quanto se gasta em tratamentos) em torno de 75% para garantir que, mesmo em situações de catástrofe, ofereça a assistência a todos e tenha como ampliar sua rede de atendimento (crescimento da empresa);


Por outro lado, se você é cliente da operadora, é de seu interesse que o valor da mensalidade seja o menor possível, mas sem o risco da empresa quebrar e você ficar sem a cobertura necessária à saúde em algum momento da vida. Mas o cliente não tem como saber se esses recursos estão sendo bem utilizados. Por isso, parte do valor dessa mensalidade vai para o setor de auditoria e controle, que verifica se os profissionais de saúde estão solicitando exames ou indicando cirurgias de acordo com as boas práticas (sem desperdícios). Isso é muito importante, porque a ANS, que controla e monitora as operadoras, determina o aumento da mensalidade baseado na sinistralidade passada. Ou seja, se as empresas de saúde tiveram muitos gastos no ano passado, a ANS aplica o reajuste com base nesse valor adicional. Por isso que em 2021 o reajuste foi negativo - não foi por fatores políticos ou bondade, foi porque as operadoras, durante a pandemia em 2020, gastaram menos. Em 2022, porém, o reajuste veio alto porque aquilo que não gastaram antes começou a ser compensado em 2021. Dados da Anahp (Associação Nacional de Hospitais Privados) indicam que a sinistralidade em 2021 foi de 76%. No segundo trimestre de 2022 já está em 87%.

Se você usa um rol de procedimentos para calcular o valor a ser cobrado dos clientes, mas esse rol é variável, como você faz as contas? Basicamente seria como ser um padeiro, vender pão a um determinado preço, mas não saber quanto vai pagar pela farinha. Ainda mais quando o governo começa a pôr ingredientes no pão que antes não faziam parte da receita.

Por outro lado, a garantia de tratamento das pessoas que realmente precisam é fundamental e prioritária no sistema de saúde, desde que baseado na evidência científica. O sistema não pode financiar tratamentos místicos, por exemplo, dentro do contexto apresentado, ou pagar férias no Caribe apenas porque o médico assim sugeriu.

Este equilíbrio que trago à reflexão é para que pensemos duas vezes ao chegarmos ao consultório médico ou de outro profissional de saúde e exigirmos "que o doutor peça tudo que tenho direito". O certo seria cobrar do profissional de saúde o que está nos protocolos, os chamados guidelines, que orientam a boa prática. Uma boa dica: pergunte ao profissional para que servem os exames que ele estiver solicitando e, caso ainda não entenda, faça uma pesquisa nas redes sociais dos órgãos sérios de saúde.

Para ajudar a refletir, trago uma analogia: quando levamos o carro numa concessionária, não pedimos para fazer a revisão de 60 mil quilômetros se o carro ainda estiver em 10 mil. É evidente que é desnecessária.

Artigo assinado por: Dr. Douglas Yugi Koga, cirurgião do aparelho digestivo e integra o corpo clínico do Hospital dos Fornecedores de Cana, da Unimed e do Gastrocentro de Piracicaba. Pré-candidato a deputado federal pelo Novo.

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