Foto: Alan Santos/ PR
O
Ministério das Comunicações está barrando o acesso a dados públicos e usando o
período eleitoral como justificativa. Através da Lei de Acesso à Informação
(LAI), a Agência
Pública requisitou o acesso às peças produzidas nas
campanhas “Governo Honesto, Trabalhador e Fraterno”. No início de agosto, revelamos que o governo pagou quase R$ 90 milhões neste ano para agências
de publicidade realizarem as três campanhas.
O acesso às peças foi negado, segundo o
Ministério, devido ao “período de defeso eleitoral”. Nas palavras do governo, o
período “restringe a divulgação de material publicitário com assinatura/marca
figurativa do governo federal”.
A justificativa do governo, contudo, não
tem fundamento na legislação que trata da divulgação publicitária no período
das eleições, baseada na chamada Lei das Eleições, a 9.504/1997.
“A legislação eleitoral não impede o
atendimento a pedidos de acesso à informação. Pelo contrário. É justamente em
período eleitoral que o cidadão tem (ainda mais) direito a acessar informações
públicas, mesmo se essas informações forem peças publicitárias feitas pelo
órgão de comunicação”, explicou à reportagem Bruno Morassutti, cofundador e
coordenador de advocacy da agência de dados independente e especializada na Lei
de Acesso à Informação (LAI), Fiquem Sabendo.
A Pública apurou que a justificativa já
foi utilizada outras vezes pelo Ministério das Comunicações para negar
acesso a dados públicos. Em julho, a pasta negou enviar as transcrições dos
discursos do presidente Jair Bolsonaro (PL) usando o período de defeso como
razão. Outro pedido, que requisitou o acervo dos vídeos publicados no canal do
Planalto no YouTube entre 2018 e 2022 também foi negado com a mesma
justificativa.
“Estamos em um momento particularmente sensível em relação às
consequências da falta de informação. É sempre lesivo em uma democracia, há um
dano difuso, quando não se cumpre a lei de acesso à informação. Mas em especial
no período eleitoral essa informação é ainda mais relevante para que a
população compreenda se o governo está fazendo propaganda institucional e quais
os seus custos, ainda mais quando o chefe do poder é um dos candidatos”,
explica o consultor da Transparência Internacional Brasil, Michael Mohallem. Na
visão do especialista, quando órgãos públicos não cumprem com o acesso à
informação e a transparência à utilização de recursos públicos, há mais brechas
para corrupção e desvio da finalidade da máquina pública. “O não cumprimento
pode caracterizar infração disciplinar de um agente político ou autoridade que
decida pela não resposta. No limite, isso pode levar a um processo de
improbidade administrativa”, explica.
Governo pagou R$ 89 milhões para seis meses de
campanhas positivas
Os quase R$ 90 milhões pagos pelo
Ministério das Comunicações para agências de publicidade realizarem as três
campanhas “Governo Honesto, Trabalhador e Fraterno” foram atestados entre
fevereiro e junho deste ano — justamente o período que antecedeu as restrições
por causa das eleições. Desde o dia 2 de julho, a Secretaria Especial de
Comunicação Social do Governo Federal (Secom) deletou os seus perfis nas redes
sociais, tornando impossível acessar o conteúdo dessas campanhas. No período, é
proibido qualquer ação de comunicação que possa configurar propaganda eleitoral
ou desvio de finalidade — a legislação não cita a Lei de Acesso à Informação.
O Ministério informou à reportagem que as
três campanhas milionárias levaram à produção de filmes para TV, Internet e
plataformas de vídeos curtos, spot, posts e banners para redes sociais, peças
para digital out of home (DOOH), mobiliário urbano (MUB), vinhetas, anúncio
para jornal e revista, adesivo e minidoor.
Ainda segundo o governo, apesar dos
pagamentos terem ocorrido apenas neste ano, as peças foram veiculadas desde 18
de dezembro de 2021. A última veiculação teria ocorrido em junho de 2022,
totalizando pouco menos de seis meses de campanhas. Em média, isso equivale a
um gasto de mais de R$ 504 mil por dia para a veiculação.
Secretaria de Comunicação é 8º anunciante do Facebook no Brasil em
temas políticos
O Governo Federal, através da Secretaria
Especial de Comunicação Social, já gastou mais de R$ 896 mil em anúncios nas
redes do Facebook/Meta desde agosto de 2020. O gasto coloca a Secom como o
oitavo maior anunciante na plataforma dentre todos os anúncios marcados como
temas sociais, eleições ou política. O primeiro lugar é ocupado pela Brasil
Paralelo.
Segundo os dados do Facebook, a Secom
gastou em média R$ 32 mil para cada anúncio. Ao todo, foram 28 anúncios.
Um dos exemplos é de um anúncio sobre o
Auxílio Brasil, ainda com o valor de R$ 400. A postagem, veiculada no Facebook
e Instagram entre 25 e 30 de junho, custou entre R$ 80 mil e R$ 90 mil. Ela
rendeu mais de 1 milhão de impressões, a maior parte vista por mulheres entre
25 e 34 anos, que acessaram do estado de São Paulo.
Foto: Reprodução
Além
disso, o Governo Federal gastou outros R$ 500 mil em anúncios que não foram
veiculados com o rótulo da Secom. Ao todo, o Governo gastou mais de R$ 1,3
milhão em anúncios nas redes do Facebook.
Ministério das Comunicações diz que não impulsiona conteúdo nas redes
Apesar de ser um dos maiores anunciantes
do Facebook em temas políticos, a Secretaria de Comunicação do Governo Federal
tem dificultado o acesso às informações sobre esses impulsionamentos. Isso
porque, em resposta a um pedido de acesso à informação, o Ministério das
Comunicações — estrutura da qual a Secom faz parte — afirmou que “não
houve nenhuma publicação impulsionada” nas redes gerenciadas pelo Ministério.
“Nosso tráfego em todas as redes sociais é adquirido 100% de forma orgânica”,
acrescentou a pasta.
Contudo, segundo dados do Governo, a
Secretaria Especial de Comunicação Social do próprio Ministério pagou quase R$
30 milhões para agências de publicidade realizarem campanhas em redes sociais
durante a presidência de Jair Bolsonaro.
A maior parte desse valor foi paga para
as agências realizarem ações no Facebook, mais de R$ 15,8 milhões. Outros R$
11,3 milhões foram pagos para campanhas no Twitter, R$ 2,5 milhões no Linkedin
e R$ 286 mil no Tik Tok.
Esses valores foram pagos a quatro
agências de publicidade e propaganda que têm contratos com o governo: Calia/Y2,
Artplan, Nova S/B e PPR. Dos R$ 30 milhões pagos pelo governo a essas empresas,
R$ 25,6 foram repassadas às plataformas — parte do dinheiro que o governo gasta
fica com as próprias agências, que cobram pelo trabalho de anunciar em redes
sociais, TVs, rádios e outras mídias
Questionado pela reportagem, o Ministério das Comunicações informou que não responde pelas redes da Secom. Já a assessoria de imprensa da Secom não respondeu aos questionamentos da reportagem e orientou que os pedidos fossem realizados via Lei de Acesso. Os pedidos via LAI, contudo, precisam ser direcionados ao Ministério das Comunicações no sistema do governo, desde a recriação do Ministério, que ocorreu em julho de 2021.
Texto: Agência Brasil/ Parceiro da Rádio Metropolitana de Piracicaba
Publicação: Enzo Oliveira/ Radialista Redator RMPTV