Foto: Rubens Cardia

Vereadores e familiares de pessoas que vieram a óbito após passarem por atendimento na unidade fizeram críticas e cobranças durante audiência pública nesta terça-feira.

A organização social de saúde (OSS) Mahatma Gandhi foi questionada, durante audiência pública realizada pela Câmara na tarde desta terça-feira (31), acerca da morte de ao menos quatro pacientes desde que assumiu a gerência da UPA (unidade de pronto-atendimento) da Vila Cristina, em julho.

Autor do requerimento que convocou a discussão, o vereador Cássio Luiz Barbosa (PL), o Cássio Fala Pira, exibiu vídeo com relatos de pessoas próximas aos pacientes, que morreram entre agosto e outubro —algumas das quais também presentes no plenário para cobrar explicações dos responsáveis pela UPA.

Também houve questionamentos dos vereadores sobre a atuação da equipe que atendeu Jamilly Vitória Duarte, de 5 anos, na noite de 11 agosto, após a menina ter sido picada por escorpião e vir a óbito no dia 12 —o caso está sendo apurado pela Câmara por meio de Comissão Parlamentar de Inquérito.

Aos representantes da Mahatma Gandhi, Cássio Fala Pira perguntou quais procedimentos são adotados em casos de emergência e urgência, se a equipe que assumiu a unidade passou por cursos preparatórios e se houve um período de transição entre a saída dos funcionários de carreira que trabalhavam na UPA e a entrada da OSS.

Diretor da UPA da Vila Cristina, o médico Robert Castro Sobrinho explicou a distinção usada pela equipe para classificar de acordo com a gravidade os pacientes que buscam atendimento, respondeu que é requisito para os profissionais contratados pela OSS ter cursos obrigatórios e relatou que, na transição, a equipe anterior repassou à que a sucedeu "os fluxos, as principais queixas da população e a maneira como se trabalhava antes".

"A capacitação é feita gradativamente. Exige-se que os profissionais passem por treinamentos. A proposta é treiná-los e atender o munícipe da melhor forma possível. Fazemos a solicitação de contratação, abrimos as vagas, fazemos a entrevista com o profissional e sua incorporação na equipe. Depois é apresentado um protocolo do que ele deve fazer", completou Jean Paes de Oliveira, administrador operacional da unidade.

Familiares de pessoas que vieram a óbito após buscarem atendimento na UPA da Vila Cristina fizeram críticas à forma como os casos foram tratados pelas equipes. Pedro Almeida perdeu o filho, de 24 anos, no último dia 10, depois de o jovem, debilitado, receber soro das 12h às 16h, na véspera, e em seguida ser liberado.

"O que o moleque tinha? Morreu 'do nada'", disse o pai, sobre a causa da morte seguir sem definição. Ele lamentou que o jovem tenha sido liberado mesmo não estando bem. "Ficou tomando soro do meio-dia às 16h. Houve descaso total ali. Acho muita incompetência; se o médico tivesse a visão de médico mesmo, ele não teria liberado o meu filho."

Rosilda Maria da Silva cobrou justiça ante a morte do filho, que, com febre alta, procurou atendimento na UPA em 11 de outubro, teve negado o pedido por internação que ela fez no dia 13 e veio a falecer dois dias depois. "No dia 15 eu pedi ao médico a internação. O médico da emergência olhou o prontuário e falou que não era caso de internação, passou soro", criticou. "Estou questionando aqui o motivo da negligência: por que não quiseram internar meu filho enquanto era tempo?"

Robert disse que a decisão pela internação de pacientes depende da avaliação feita pelo médico no dia e que, nos dois casos, uma investigação interna foi instaurada. O vereador Laércio Trevisan Jr. (PL) comentou que os casos mostram que há falta de "percepção" para o encaminhamento à internação em hospitais. "Tudo cai na demora; é claro que não houve encaminhamento ao hospital", lamentou.

O parlamentar questionou se, nos casos de pessoas que vieram a óbito, havia sido solicitada vaga imediata para a internação delas e se existe vaga-zero nessas situações. "Acho muito grave o que vem ocorrendo na UPA da Vila Cristina. Percebe-se, principalmente no caso da Jamilly, que não houve o atendimento adequado; foi uma negligência, na minha opinião. Por que as pessoas que sabiam que tinha o soro não pediram para o soro ser aplicado?", perguntou.

Robert disse que, no caso de Jamilly, o soro "só não foi administrado porque houve perda do acesso periférico" e que, sobre os pedidos por internação, "a Central de Vagas é que decide". "Dependemos de surgir a vaga no que foi solicitado para os cuidados daquele paciente", afirmou.

Cássio Fala Pira criticou que a opção do Executivo por terceirizar atendimentos na saúde tenha levado à substituição das equipes de servidores de carreira que atuavam nas unidades de pronto-atendimento. "Sempre fui contra a OSS, pelo que aconteceu no passado e está ocorrendo agora", afirmou, lamentando que, antes, havia uma "estrutura" que agora deixou de existir.

Para o vereador, a contratação, sendo necessária, deveria ser direcionada a colocar em funcionamento unidades de saúde que estão com o prédio finalizado mas ainda sem operação. "Precisamos colocar eles lá na ponta, porque têm muitos PSFs e Crabs que não foram inaugurados até hoje, como na Água Branca, na Balbo e no Vida Nova. O problema está na ponta e não está sendo solucionado."

"O que pedimos hoje é mais seriedade com essas pessoas, mais intensidade no atendimento do pronto-socorro, e que o secretário possa resolver os nossos problemas, que estão na ponta, pois muitos desses prontos-socorros estão sobrecarregados porque está faltando uma atenção básica", completou Cássio Fala Pira.

O secretário municipal de Saúde, Douglas Koga, disse que o Executivo trabalha para reforçar a atenção primária e secundária a fim de desafogar a busca da população pelas unidades de pronto-atendimento, cujo "fluxo é muito grande mesmo". Segundo o titular da pasta, Piracicaba soma em 2023, até setembro, mais de 500 mil atendimentos em UPAs.

"Isso acontece por uma série de motivos, que não foram criados nos últimos meses [com a vinda da OSS]. Temos que reduzir a pressão no pronto-atendimento e reforçar a atenção básica, mas para isso precisamos melhorar o acesso. A sobrecarga que temos faz pressão sobre os hospitais, pela necessidade de leitos. E não é só criar leitos; os hospitais têm que ter espaço para isso", refletiu Douglas, citando que uma das saídas está na expansão do Hospital Regional.

"Estamos fazendo uma estratégia de ataque de problemas que estão identificados agora: alguns é preciso resolver de forma imediata e outros eu tenho que ser programático, para atenuar problemas de saúde no futuro. O setor de urgência e emergência está sobrecarregado, então aumentamos a atenção primária e estamos com credenciamento de médicos de especialidades para aliviar a atenção secundária", completou o secretário.

NÚMEROS - Durante a audiência pública, o vereador Gustavo Pompeo (Avante) perguntou como está o fluxo de pacientes e se há equipe suficiente para os atendimentos. Membro da equipe técnica da Mahatma Gandhi, o enfermeiro Fábio Segatti assegurou não haver déficit de profissionais e informou que a OSS prestou 13.636 atendimentos em julho, quando assumiu a UPA da Vila Cristina, 15.421 em agosto e 14.182 em setembro, totalizando 43.239 no período.

A taxa de óbitos registrados na unidade ficou em 0,09% no período —e em 0,16% se somados os casos de mortes domiciliares. "A UPA da Vila Cristina está mantendo uma baixa média de óbitos, de 0,09% de óbitos ocorridos na unidade em três meses; está bem baixa, até mesmo num comparativo com outras unidades", declarou.

Em resposta a perguntas feitas pelo vereador Josef Borges (Solidariedade), Fábio informou que a UPA da Vila Cristina atendeu 168 pessoas picadas por escorpião desde julho e que 17 médicos atuam na unidade a cada plantão de 24 horas —na UPA da Vila Sônia, onde 32.840 atendimentos foram feitos desde que a Mahatma Gandhi a assumiu, também há três meses, são 11 médicos.

Também estiveram presentes na audiência pública os vereadores Acácio Godoy (PP), Fabrício Polezi (Patriota), Zezinho Pereira (União Brasil) e Rai de Almeida (PT) e o procurador-geral do município, Guilherme Mônaco de Mello.

"Tenho a convicção de que não perdemos mais vidas pela presença ostensiva de alguns vereadores nas UPAs e da abnegação de servidores públicos, funcionários que foram além do dever do oficio e fizeram a mais. Tenho a expectativa de que se caminhe para melhorar, mas precisamos acelerar o passo. Estamos errando em não dar às pessoas transparência das dificuldades que estamos enfrentando, em compra de remédios ou na limitação que há no número de ambulâncias", comentou Acácio Godoy, que preside a CPI do caso Jamilly.

"Confio nas pessoas que estão à frente da CPI e logo mais os apontamentos serão levados a público e norteamentos serão realizados. Se houve falhas de procedimento médico, tenho certeza de que vai ser apontado e corrigido", afirmou Fabrício Polezi, em relação à morte de Jamilly. Zezinho Pereira questionou se a UPA da Vila Cristina está preparada para que casos como o de Jamilly não se repitam. "Tem que resolver a questão não paliativamente, mas definitivamente, quando dá", cobrou.

Texto: Câmara Municipal de Piracicaba

Publicação: Enzo Oliveira/ RMPTV

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