A inflação oficial registrada em 2024, de 4,83%, ultrapassou o limite superior da meta estabelecida pelas autoridades econômicas, reacendendo discussões sobre os desafios enfrentados pela economia brasileira. Embora esse índice esteja distante de cenários catastróficos do passado, sua implicação para a sociedade e os setores produtivos não deve ser subestimada, sobretudo pelo impacto desproporcional sobre as classes mais vulneráveis.

Ultrapassar o teto da meta inflacionária não é necessariamente uma catástrofe, mas é um alerta importante. O Banco Central, ao conduzir a política monetária, tem como objetivo manter a inflação dentro de um intervalo que garanta a estabilidade de preços sem comprometer o crescimento econômico. Quando esse equilíbrio não é alcançado, surgem dúvidas legítimas sobre a eficácia das decisões tomadas e sobre as estratégias adotadas para controlar o índice de preços.

O impacto mais direto da inflação é sobre o poder de compra das famílias. Rendas já pressionadas pela desigualdade sofrem ainda mais, com a alta nos preços corroendo a capacidade de acesso a bens essenciais, como alimentos, medicamentos e transporte. Para os brasileiros de menor renda, que já alocam grande parte de seus ganhos em necessidades básicas, a inflação força escolhas dolorosas, como priorizar a alimentação em detrimento de despesas igualmente fundamentais, como saúde e educação. Esse cenário agrava a desigualdade e aumenta a insegurança econômica para milhões de pessoas.

Do ponto de vista empresarial, a inflação acima da meta compromete o planejamento de longo prazo. A incerteza sobre preços futuros desestimula investimentos, reduzindo o ritmo de geração de empregos e desacelerando o crescimento econômico. Esse ambiente de instabilidade também afeta investidores, que passam a buscar refúgio em ativos mais seguros, muitas vezes fora do país, prejudicando ainda mais a economia nacional.

É necessário reconhecer que a inflação atual é resultado de uma combinação complexa de fatores. Externamente, eventos como oscilações nos preços de commodities, tensões geopolíticas e variações cambiais têm um papel significativo. Internamente, gargalos estruturais persistentes, como baixa produtividade, infraestrutura precária e uma carga tributária asfixiante, amplificam os desafios. Esses fatores estruturais não podem ser resolvidos apenas com ajustes na taxa de juros, embora essa medida seja uma ferramenta importante no curto prazo.

Pensadores ao longo da história oferecem diferentes perspectivas sobre o combate à inflação. John Maynard Keynes, por exemplo, destacou que o excesso de demanda é uma das principais causas da inflação, propondo políticas fiscais e monetárias restritivas para enfrentá-la. No entanto, ele advertia que medidas excessivamente austeras poderiam levar a um aumento do desemprego, criando um dilema para os formuladores de políticas. Milton Friedman, por sua vez, enfatizava que a inflação é sempre um fenômeno monetário, defendendo o controle rigoroso da oferta de dinheiro como solução. Já Joseph Stiglitz argumenta que, em sociedades marcadas por desigualdades profundas, o combate à inflação deve ir além do aumento de juros, incorporando políticas sociais que minimizem os impactos sobre os mais pobres.

A resposta do governo brasileiro a esse cenário será decisiva. As soluções não podem se limitar à elevação da Selic, que, embora útil para conter a demanda, tem efeitos colaterais severos, como a desaceleração econômica e o aumento do custo do crédito. É indispensável combinar políticas fiscais responsáveis com investimentos estratégicos e reformas estruturais que promovam o crescimento sustentável. Além disso, a proteção social deve ser uma prioridade, garantindo que as populações mais vulneráveis não sejam ainda mais prejudicadas pelo peso da inflação.

Acima de tudo, é necessário lembrar que os números da inflação não são abstrações; eles refletem realidades vividas por milhões de brasileiros. Controlar a inflação não é apenas uma questão técnica, mas também uma questão moral e política, que exige ações equilibradas e voltadas para o bem-estar coletivo. O desafio que se apresenta agora é transformar esse alerta em uma oportunidade para corrigir rumos, reduzir desigualdades e construir uma economia mais estável e justa.

Assinado por Ronaldo Castilho - Jornalista e bacharel em Teologia e Ciência Política, com MBA em Gestão Pública com Ênfase em Cidades Inteligentes

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