Segundo o deputado estadual Carlos Gianazzi (PSOL-SP), que participou de diversas outras manifestações anteriores na frente do prédio da Cinemateca Brasileira (CB), na Vila Mariana, em São Paulo, a tarde deste sábado, 7 de agosto, abrigou aquele que é “talvez o maior ato de todos os tempos em defesa da Cinemateca”. Cerca de 500 pessoas, segundo estimativa informal da Guarda Civil Metropolitana (GCM), compareceram ao protesto convocado para debater e repudiar a situação de atual abandono que vive o maior acervo audiovisual do País e um dos maiores da América do Sul. Além de São Paulo, outros seis Estados tiveram atos pela Cinemateca.

“É um leque de apoio como nunca vi”, disse Carlos Augusto Calil, presidente da Sociedade Amigos da Cinemateca (SAC), ao discursar para a multidão. Eram, em sua maioria, cineastas, técnicos, intelectuais e ativistas da cultura, assim como moradores do bairro da Vila Mariana, famílias com crianças e cães. Muitos cartazes contundentes responsabilizavam os gestores federais da cultura pelos dissabores que a CB vive atualmente. “Os moradores têm orgulho de serem vizinhos da Cinemateca”, disse Calil.

Em sua exposição, Calil lembrou que a trajetória histórica da instituição não foi sempre suave, que houve diversos momentos dramáticos e incidentes – o incêndio do dia 30 de julho, que queimou 25% de um prédio do acervo na Vila Leopoldina, foi o quinto que a Cinemateca enfrentou (“Podia até ser o título de um filme inglês: Cinco incêndios e uma inundação”, afirmou). Depois, a Cinemateca passou a ser vista com mais respeito e viveu seu auge já como patrimônio federal, mas começou a decair justamente com um ato de moralismo administrativo. “Em 2013, a (então) ministra Marta Suplicy, num ato de violência, destituiu o diretor”. Havia uma suspeita de improbidade, mas o processo foi doloroso. “Ele foi demitido, a apuração veio depois. A instituição entrou num limbo administrativo. Ela não está em lugar nenhum”, disse Calil. Segundo o professor, o risco agora é que os técnicos têm seu acesso às instalações impedido e é necessário que experts avaliem permanentemente o acervo. “Estou convencido que seria minimizado (as consequências do incêndio) se os funcionários estivessem presentes”.

Daniel Santiago, diretor da Associação Paulista de Cineastas, lamentou a postura do governo, que há mais de um ano promete uma solução emergencial para a Cinemateca e posterga indefinidamente essa decisão. “Infelizmente não voltamos para festejar,  mas para manifestar nossa indignação”, afirmou.

“Não tem mais conversa com esse governo, eles não são confiáveis”, disse a representante de uma das associações de moradores da Vila Mariana, que move uma ação civil pública contra a Secretaria Especial de Cultura. Havia muitos cartazes pedindo a prisão imediata do secretário Mario Frias e também a saída de seu secretário adjunto, Hélio Ferraz, assim como um uníssono quando o grito era “Fora Bolsonaro”, identificado como um dos maiores inimigos históricos da cultura.

“Nós estamos dialogando com delinquentes, com bandidos. Eles foram contratados para destruir a Cinemateca”, discursou o deputado Carlos Gianazzi, sob aplausos; Gianazzi entrou com uma denúncia criminal na Procuradoria Geral da República contra o secretário de Cultura e seu adjunto, Hélio Ferraz.

Para os manifestantes, não é possível que o governo insista na ideia de esperar até setembro para decidir qual será a nova organização social que gerirá a Cinemateca. O caso é de urgência há muito tempo. Em janeiro, o governo acenara com uma permissão para a Sociedade Amigos da Cinemateca iniciar uma gestão de emergência e fazer uma transição para o novo modelo jurídico-administrativo que poderá abarcar a instituição. Mas já se passaram 7 meses e não mais voltou a falar nisso.

Carlos Augusto Calil afirmou que os R$ 10 milhões definidos no edital de chamamento da OS para a Cinemateca representam apenas metade de suas necessidades atuais. A denúncia do FAROFAFÁ, de que não existe nenhum técnico cuidando do acervo (nem do incendiado, nem do principal, na Vila Mariana) foi corroborada pelos especialistas presentes. “Apesar de toda a mobilização, a Cinemateca continua abandonada. Não há um técnico cuidando”, afirmou Gianazzi, que participou de uma vistoria na instituição. Ele disse que há um grande engajamento popular e a imprensa tem se mostrado sensível à situação, mas citou a canção “Haiti”, de Caetano Veloso e Gilberto Gil, como um retrato do paradoxo que se vive atualmente: “Nem a lente do Fantástico/Nem o disco de Paul Simon”, nada disso faz com que o governo abandone sua determinação de deixar a Cinemateca ser arruinada.

Fotos e texto:   Jotabê Medeiros



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