Ronaldo Castilho
O
mundo contemporâneo está imerso em uma era de grandes transformações, onde o
equilíbrio de poder está se deslocando de maneira significativa. As
instituições globais, como o G20, desempenham um papel fundamental na gestão
das questões internacionais, mas enfrentam desafios complexos em um cenário de
crescente multipolaridade. A realização da Cúpula do G20 no Rio de Janeiro, em
2024, foi uma oportunidade única para refletir sobre os obstáculos que a
governança global precisa superar em um mundo cada vez mais fragmentado, onde
múltiplos centros de poder, interesses e visões competem pela definição das
agendas internacionais.
A
multipolaridade é um fenômeno caracterizado pela ascensão de diversas
potências, tanto econômicas quanto políticas, que emergem como atores centrais
nas relações internacionais. Ao contrário do mundo unipolar pós-Guerra Fria,
dominado pelos Estados Unidos, o cenário atual é marcado pelo ascenso de países
como China, Índia, e as nações da União Europeia, além de outras economias
emergentes, que buscam maior protagonismo nos fóruns globais.
Esse
novo cenário multipolar apresenta desafios significativos para a governança
global. Primeiramente, a multiplicidade de interesses e visões sobre questões
cruciais, como mudanças climáticas, comércio internacional, segurança e saúde,
torna as negociações mais difíceis e complexas. A busca por consensos entre
potências com objetivos divergentes frequentemente resulta em impasses, como se
observa nas negociações climáticas e comerciais.
Outro
desafio importante é a reforma das instituições internacionais, que foram
concebidas em um contexto de poder unipolar. Organizações como o Fundo
Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial e o próprio Conselho de
Segurança da ONU foram estruturadas para um mundo no qual os Estados Unidos e
seus aliados dominavam as decisões globais. A representação de países em
ascensão, como Índia e Brasil, ainda é insuficiente nessas instituições, o que
gera um sentimento de marginalização e desconfiança por parte dessas nações.
A
Cúpula do G20 no Rio de Janeiro, embora tenha enfrentado o desafio de conciliar
interesses globais e regionais, foi um passo importante para destacar o papel
do Brasil no cenário internacional. O país se posicionou como uma voz de
mediação entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, buscando equilibrar
as expectativas de diferentes blocos, como os Estados Unidos e a China, em
torno de questões essenciais.
Um dos
temas centrais da Cúpula foi, sem dúvida, a crise climática. As potências
globais apresentam interesses divergentes sobre como mitigar os efeitos das
mudanças climáticas, com países em desenvolvimento exigindo maior apoio
financeiro, enquanto os países desenvolvidos enfrentam pressões para reduzir
suas próprias emissões. O Brasil, com sua rica biodiversidade e papel
fundamental na preservação da Amazônia, esteve no centro de debates sobre
políticas ambientais, buscando balancear as expectativas de desenvolvimento
econômico com os compromissos de sustentabilidade.
Outro
ponto relevante foi a crise do comércio global, marcada pelas intensas disputas
comerciais entre os EUA e a China, impactando diretamente as economias
emergentes. O G20 teve a missão de promover a cooperação econômica e evitar um
retorno às políticas protecionistas, que poderiam prejudicar os países mais
vulneráveis. O presidente Joe Biden enfrentou desafios que resultaram em uma
presença menos destacada no evento. Um incidente notável foi o atraso de Biden,
que o impediu de participar da tradicional foto de grupo dos líderes mundiais,
ficando de fora da imagem oficial. A Casa Branca atribuiu o erro a questões
logísticas relacionadas ao tempo e à organização do evento. Além disso, Biden
evitou mencionar publicamente o então presidente eleito Donald Trump durante
sua viagem ao exterior, incluindo a participação na Cúpula do G20. Sua
interação com a imprensa foi limitada, sem realizar uma coletiva de imprensa
tradicional. Apesar da iminente transição presidencial nos EUA, Biden manteve
sua agenda internacional, reunindo-se com outros líderes mundiais e alcançando
acordos, como o controle da inteligência artificial em sistemas de armas
nucleares com o presidente chinês Xi Jinping. Esses eventos destacaram uma
presença menos proeminente de Biden, especialmente em comparação com líderes
como Xi Jinping, que teve um papel mais ativo e visível durante o encontro.
Ao
assumir a presidência da Cúpula do G20, o Brasil enfrentou desafios internos e
externos. No contexto externo, o país articulou um consenso entre potências
globais e emergentes, utilizando uma habilidade diplomática refinada.
Internamente, o Brasil teve de lidar com um cenário político instável, o que
dificultou a implementação de políticas eficazes no âmbito global. A coesão
política foi essencial para garantir que o país se apresentasse de forma
unificada na cúpula e mantivesse uma posição sólida nas negociações.
A governança global em um mundo multipolar exige adaptação, flexibilidade e cooperação entre diversos atores com interesses e valores distintos. A Cúpula do G20 no Rio de Janeiro foi um palco crucial para enfrentar esses desafios, além de ser uma oportunidade de demonstrar que, apesar das dificuldades, o diálogo e a diplomacia ainda podem prevalecer. O Brasil, ao sediar este evento, teve a chance de mostrar seu compromisso com uma ordem global mais inclusiva, sustentável e justa, onde as vozes dos países em desenvolvimento são ouvidas de forma mais equitativa. No entanto, o caminho para a construção dessa governança global continua complexo, com muitos desafios a serem superados.
- Ronaldo Castilho é jornalista e bacharel em Teologia e Ciência Política