Foto: Reprodução/ Diário do
Engenho
O local sempre foi povoado de
lembranças antigas – vindas de tempos em que fazendas e sítios ainda povoavam o
entorno da cidade. O casario – as chamadas casas de colônia – traziam uma
arquitetura que foi mantida com reformas que lhe deram mais conforto, mas sem
destruírem aquela ideia de terem sido morada dos que trabalhavam a terra. Havia
árvores centenárias – que numa tempestade maior vieram ao chão, mostrando
raízes que deram muito trabalho para serem removidas. E havia o celeiro ou
estábulo – não tenho certeza – recuperado para transformar-se em restaurante,
mas mantendo sua estrutura original. Havia respeito pelo que acontecera antes,
naquele local que a UNIMEP tomou para si – para cuidar, para fazê-lo útil e
especial.
Não foram poucos os que ali
viveram momentos referenciais. Religiosos – inclusive os metodistas – ali
realizavam encontros para debater e refletir sobre sua fé e os rumos de suas
crenças. Sindicalistas, que não tinham onde se reunir sem o medo de serem atacados,
ali também se encontraram. Gente que vinha de muito longe para encontros sobre
alfabetização solidária – e que muitas vezes precisou também da solidariedade
da comunidade da universidade para receber agasalhos porque ali também fazia
frio à noite, algo desconhecido para aqueles grupos vindos do Nordeste.
No começo, a gente até
reclamava que ficava longe sair do campus Taquaral para ir almoçar na
Fazendinha. Ah! absurdos… Mas os almoços ali eram sempre cheios de conversa,
juntando chefes e subordinados, professores e funcionários, histórias que iam
além do cotidiano. Eram momentos divertidos. E a comida era boa!
E as crianças e famílias do
Piracicabano? Quantas festas de final de ano, da família, do aniversário do
colégio, que transformavam aqueles largos espaços em momentos de muita alegria,
de muita diversão, muito convívio, muito esporte. Dividia-se a comida,
dividiam-se presentes, partilhavam-se expectativas.
E se é para falar em crianças,
quantas – hoje adultos que andam mundo afora – não carregarão consigo as
lembranças dos acampamentos infantis, onde as casas da colônia se enchiam de
meninos e meninas com seus monitores, durante uma semana, com suas noites em
torno de fogueiras, com caça ao tesouro, com atividades de acabar com o fôlego
de qualquer adulto? Impossível esquecer como as galinhas faziam sucesso entre
as crianças que vinham de São Paulo ou de grandes centros.
Admito que assistir ao vivo,
online, o leilão deste espaço, ontem pela manhã, foi algo mais constrangedor do
que dolorido. O leiloeiro – que de vez em quando até pedia ajuda a outra
pessoa, que não aparecia, para validar o andamento do procedimento – conversava
com quatro ou cinco interessados, aceitando lances que aumentavam de 5 em 5 mil
reais – digam, o que é que se compra com 5 mil reais? Lamentava a inexistência
da telefonista por conta dos problemas em Porto Alegre – o leilão estava sendo
gerado de lá – e de vez em quando até parecia querer antecipar eventuais
críticas às imagens do site que, insistiu ele mais de uma vez, eram meramente
ilustrativas. E chegou a explicar que ali estivera, era área em completo
abandono, com mato tão crescido que até mesmo dificultava o acesso.
O tempo passa e os espaços se
transformam. Faz parte da vida. Mas há que se perguntar – quem decidiu que era
melhor se livrar da Fazendinha terá algum dia, antes de fazê-lo, se perguntado
e se interessado em saber o que se viveu e o que houve ali? Memórias são
seletivas, mas são especialmente corroídas onde o que predomina é a ignorância
daqueles que detém o poder. Com certeza é o caso dos gestores metodistas
atuais.
NOTA DOS EDITORES: A
chamada Fazendinha da UNIMEP – uma área de 35.244 m2 de terreno contígua
ao campus Taquaral, com cerca de 1.831 m2 de área construída identificada pelo
leiloeiro como edificações simples – foi a leilão no final da manhã desta
segunda-feira (13 de maio), sendo arrematada por R$ 4.140.000,00, embora a
avaliação inicial fosse de R$ 6.700.000,00. A venda aconteceu para pagamento de
parte dos débitos tributários das escolas metodistas junto à área federal,
dentro do processo de recuperação judicial.
Texto: Beatriz Vicentini
Publicação: Enzo Oliveira/ MTV